domingo, 13 de novembro de 2011

UM CONTO NOVO...


A MULHER PERFEITA

- Tou te dizendo, ela é a mulher mais perfeita que eu já conheci, cara.
- Não acredito, não existe mulher perfeita.
- Essa é. Não tem defeito. Já procurei. Já tentei fazer ela ficar com raiva de mim, já dei em cima de amiga dela, já viajei sem avisar, furei compromisso. Nada. Ela, nada de sair do controle.
- E coisa de casa?
- Sabe fazer tudo: lava, passa, cozinha perfeito. E ainda trabalha fora e ganha mais que eu.
- E na hora ‘h’?
- É um vulcão. Faz tudo o que eu peço e não faz nem carinha de nojo.
- Bonita?
- Linda, linda!!
- Não pode ser.
- Mas é. Vou te apresentar.
- É porque tá no começo.
- Nada, cinco anos já. Já dava pra saber quem é ela, não acha?
- Cinco anos, sim, já dá.
- Pois é isso.
- Mas será que ela não vai mudar depois de te amarrar?
- Não. A mãe dela é do mesmo jeito, o sogrão contou. E uma irmã também, o marido me diz todo dia: “Casa logo, cara. Tu tirou a sorte grande.”
- É isso aí, então. Vai fundo.
- Vou mesmo, mês que vem, noivo de aliança e tudo. Já marcamos a cerimônia.
- E como é o nome dela? Adriana, que tu disse?
- Não, Ângela. Ângela Marchusci.
Aí ele lembrou de uma loirinha magrinha que ele amassou no colegial, meio cândida, meio ingênua, meio delicadinha demais. Ângela Marchusci, era esse mesmo o nome dela, ele nunca esqueceria. Aí ele se arrependeu muito de não ter agora a Ângela-mulher-perfeita-Marchusci, com quem Alexandre iria casar e que faria dele (Alexandre) o homem mais feliz do mundo.

(SLZ, 12.11.11)

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

DIA DE LEMBRAR...

CINEMA NA UFMA


AMANHÃ TEM MUIRAQUITÃ
Amanhã inicia o festival do mês de novembro do Cineclube Muiraquitã. O tema deste mês é 'cinema e africanidade': um passeio por filmes que têm a África como pano de fundo. O filme de abertura é "Barravento", de Glauber Rocha.
Amanhã, 18h, na UFMA/Imperatriz.
O Muiraquitã está agora em novo espaço: o laboratório de TV.
O espaço é pequeno, só cabem 20 pessoas. Garanta sua vaga...

domingo, 18 de setembro de 2011

UM CONTO PROSAICO


MATA-MURIÇOCA
Gostava de ficar à noite na frente da TV matando muriçocas com as mãos. Matava em si, na mulher, nos meninos e até nas visitas, se essas fossem um pouco mais chegadas.
Quando não conseguia matar uma no corpo das pessoas, levantava e batia palmas ao léu, até esmagá-la. Se não esmagasse, ficava praguejando e olhando com o canto do olho, pra ver onde ela parava. Se fosse na parede, não esmagava lá, pra não sujar e levar bronca da Paula. Era uma noite de briga quando ele deixava aquele sangue preto na parede. Espantava a bicha e era só ela descolar da parede pra ‘zapt’, uma a menos, uma a mais na mão suja.
Muitas vezes acordava no meio da noite, acendia a luz do banheiro pra ficar o quarto no lusco-fusco e ele enxergar as vítimas. Ia apertando uma por uma no corpo da Paula, depois tirando pro sangue não secar na pele dela e ele levar bronca logo no café da manhã. Passava horas assim. Quando não tinha na Paula, ia pro quarto dos meninos fazer o mesmo serviço. Lá era melhor, porque os meninos só dormiam sem lençol e se tornavam um estacionamento de muriçocas pesadonas de sangue de criança.
Ocorria também de matá-las de manhã, sacudindo as roupas nos cabides e batendo palmas loucamente, enquanto elas voavam baratinadas. Chegava a assassinar cinco, seis numa palmada só, a mão cheia de borrões vermelhos.
No seu aniversário de 50 anos, ganhou da irmã uma daquelas raquetes elétricas, a bateria. Boa ela: matava um monte de uma vez só, nem precisava levantar, era só passá-la pelo ar que as bichinhas se pregavam na grade de metal e morriam torradas, fazendo um barulho enorme e deixando um cheiro esquisito, de carne seca queimada. Se usasse muito, tinha que deixar meia hora pra recarregar e voltar à chacina por mais umas duas horas, até o braço cansar.
Mas começaram os problemas. Não podia passar a raquete pelas pessoas, que reclamavam com medo do choque. A Paula brigava agora mais com ele porque ficavam uns pedacinhos de muriçoca pretos pela casa, em cima do sofá, pregavam nos pés dela, além de aquele barulho atrapalhar a televisão. Um dia um dos meninos encostou a raquete no outro, de mal, e ele passou a noite chorando, a Paula o culpou pela falta de cuidado com o equipamento. E uma noite, enquanto ele passava a raquete pelo rosto da Paula pra pegar uma bem gordinha, ela voou, se pregou na tela e fez um barulho maior que o normal, a Paula acordou assustada e, no instinto, deu com o nariz na raquete, levou um choque e ficou com uma mancha preta uns dois dias, nem pó disfarçava. Passaram uma semana sem se falar, não adiantaram desculpas.
Ele foi obrigado a se desfazer do brinquedo. Mas continua na ativa, no método tradicional. As muriçocas não acabam nunca.
(Imperatriz, 18.09.11)

domingo, 11 de setembro de 2011

NOVO CONTO


ESCRÚPULOS DE SANGUE
Ele, na verdade, queria a irmã dela. Mas a irmã não caiu na rede dele, a mais velha foi mais fácil. Duas saídas e já a tinha levado pra cama, num hotelzinho vagabundo do centro da cidade. E aí começaram os amarramentos.
Aos trinta anos já, a irmã queria um namoro sério e ele foi ficando nessa condição. Começou a frequentar a casa, às noites, depois passou a ir de dia mesmo, os pais dela não se importavam, eram uns ‘coroas legais’, como ele dizia pros colegas. “Acredita que os coroas já deixaram eu comer ela lá no quarto dela?”. Os amigos duvidavam.
Mas a irmã não saía dos seus planos. Queria-lhe muito. Fazia todos os estratagemas para encontrá-la pela casa, ficava esperando chegar da faculdade, a despeito de ver o final de um filme, só para dar boa noite e vê-la entrar naquele jeans apertado que deixava à mostra todas as formas com que ele sonhava de noite e, invariavelmente, acordava molhado.
Dois anos de namoro, a irmã engravidou e tiveram que consumar o casamento, antes que a barriga aparecesse. Casaram no religioso, cerimônia simples, mas todos os parentes próximos lá.
Mudaram pro Mato Grosso, ela passou num concurso para um desses milhares de tribunais. Ele foi acompanhando, como professor de Matemática não teria problemas de se colocar.
O filho chegou e com ele a irmã, que viera passar um tempo ajudando, pois estava sem fazer nada depois da formatura. E talvez conseguisse uma colocação como assistente social, “o mato grosso é uma fronteira a desbravar”, todos diziam na família.
Um dia a irmã teve que viajar para uma diligência de rotina, coisa do serviço. Só uma semana, ela prometeu ao marido.
No terceiro dia, Ronaldo invadiu o banheiro em que Sandra tomava banho. Invadiu, a bem dizer, é um exagero, pois ela deixou a porta aberta. Amaram-se na lajota fria, no estreito corredor em frente ao do vaso e à pia, a porta escancarada e a criança chorando, com certeza de fome. Dali até a irmã chegar, amaram-se todas as noites, na cama dela, pois a dele não podia desonrar. Era um homem com escrúpulos de sangue, não podia destratar a dignidade da mulher.
Quando Cíntia chegou, encontrou uma casa em perfeita harmonia. Dali a dias, Sandra anunciou que não ia mais embora, que ia tentar mesmo a vida no Mato Grosso, a fronteira a desbravar, e que ela podia viajar tranquila sempre que precisasse.

ITZ, 11.09.11

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

NOVO CONTO DA ANA PAULA


Abro mais uma vez o espaço deste blog para postar um conto da Ana Paula, minha ex-aluna de Laboratório de Produção de Texto, do Curso de Jornalismo. Os contos da Ana têm algo de muito singelo e muito emotivo, que me fazem lembrar muitas das autoras da nossa literatura que foram mestras em deslindar a alma feminina, principalmente.
Ei-lo:

O DONO DO BEIJO

Eu só o tinha visto umas três ou quatro vezes, quando ainda éramos crianças. Mas desta vez foi diferente.
Cheguei. Cumprimentei. Ele me olhou com olhos de homem. Nada senti. A não ser um ligeiro desconforto. Beijou-me docemente na face. Um beijo quente e demorado.
Conversamos por algum tempo. Disse que gostava dos meus olhos. De admirá-los. Sorri timidamente. Ele continuava a me olhar de modo atrevido. E isso me desajeitava. Mas nada, nada eu sentia. Apenas fingia não perceber.
De repente o silêncio. Ele fitou os olhos em mim. Eu não o encararei. Ele foi chegando perto. Mais perto. Sentiu meu cheiro. O cheiro de meus cabelos. Roçou o nariz em meu rosto e trouxe seus lábios em direção aos meus. Eu quis recuar. Não recuei.
Desta vez senti. Senti meus pés fora do chão. Foi bom. Na verdade foi incrível! Tal qual beijo com feitiço.
Quando abri os olhos percebi o quanto sua melanina me atraia.
Seus lábios, então, me fizeram um novo convite. Fui chegando perto. Mais perto. Senti seu cheiro. Rocei o nariz em seu rosto. Levei meus lábios em direção aos dele. Até nossos olhos se fecharem novamente. Ele nem pensou em recuar.
Depois de algum tempo nos despedimos e ele não mais me procurou. Foi como se seu prazer estivesse apenas em meu encantamento. Mas de forma inusitada e imensamente amável, tempos mais tarde, ele me mostrou que não foi.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

UM CONTO NOVO...


TAPA NA CARA

- Quem bate esquece, doutor, mas quem apanha guarda pro resto da vida.
- Como foi que aconteceu?
- A morte?
- Não, o tapa na cara.
- Foi em 85. Uma besteira. Eu tava no serviço, roçando minha roça quando os capangas chegaram. Me pegaram pelo braço e me botaram dentro da D-20 dele. Não disseram nada, mas eu já sabia que eram jagunços dele. Me levaram pra casa dele, que ficava numa outra fazenda, perto daquela onde eu botei minha roça. Me empurraram pra fora do carro e eu caí, já nos pés dele. Ele me levantou pelo braço e, com o dedo na minha cara, me disse que aquela terra era dele, que eu era um ladrão de terra vagabundo, que eu fosse pra puta que pariu. Me deu um tapa na cara e me empurrou. “É só um recado”, ele disse, e entrou. Aí os capangas me levaram de volta.
- E ficou nisso?
- Ficou. Eu peguei minhas coisas, peguei a mulher e os dois meninos e saí de lá. Fui morar na casa do meu sogro, perto da beira do rio. Lá montei uma quitandinha e fui fazendo a vida. Mas nunca me esqueci daquele tapa na cara, não senhor.
- E você fez o quê?
- Até ontem, nada. Só comprei uma faca de limpar porco e todo dia, de tardinha, eu afiava ela na pedra, perto do jirau.
- Nunca teve vontade de ir procurar ele?
- Tive, mas nunca fui. Mas sempre pedi a Deus que botasse a oportunidade no meu caminho. Vinte anos eu pedindo, Deus nunca me ouviu. Mas ontem aconteceu. Acho que foi o diabo que criou a oportunidade.
- Mas por que justamente na frente da criança?
- Eu não planejei nada, mas não podia perder a oportunidade. Toda vez que eu saía de casa, levava a faca dentro da calça, metida na cintura. Tinha a esperança de um dia encontrar ele e acertar as contas. Ontem eu vinha subindo a rua e encontrei ele sentado na cadeira, de costa pra rua, com a menina no colo. Eu não pensei duas vezes: tirei a faca da cintura, cheguei rápido nele e enfiei no pescoço.
- Um golpe só?
- Um golpe só, meti a faca até o cabo e fiquei segurando firme, olhando ele de cima, sem afrouxar a mão. Ele foi soltando a menina e o braço amoleceu. A menina ficou gritando “vovô, vovô”.
- Ele disse alguma coisa?
- Nada. Só ficou me olhando com o olho duro, parecia uma estátua com a cabeça pra cima.
- E tu?
- Também não disse nada. Só fiquei olhando ele com o olho de ódio. Queria que ele morresse vendo a minha cara. Queria que ele se lembrasse e soubesse por que que ele tava morrendo.
- E depois?
- Depois que ele ficou todo vermelho do sangue e amoleceu o corpo todo, eu puxei a faca e saí correndo.
- E foi se esconder?
- Não. Fui pra casa avisar a mulher e esperar vocês.
- E agora o senhor vai ficar preso pelo resto da vida.
- Tá certo, doutor. Eu não reclamo. Sou velho, não demoro mais. Minha vida ganhou sentido de novo.

LAGO DA PEDRA, 03.09.11

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

MARCHA DOS 20 MIL


Ontem em Brasília cerca de 20 mil trabalhadores marcharam do estádio Mané Garrincha até a frente do Congresso Nacional para protestar contra as políticas do governo Dilma.
Professores de todos os níveis, funcionários públicos, petroleiros, estudantes, gráficos, centrais sindicais, todos demonstrando o seu descontentamento diante das ações do Congresso Nacional e do executivo federal, que só prejudicam os trabalhadores.
Greves pipocam por todo o país. Se Dilma não mudar sua rota, foi o que disseram lá, vem aí uma greve mais nacional ainda...

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

UM CONTO NOVO, DE ONTEM


CINCO MINUTOS GUARDADOS*

Acendeu o cigarro e ficou na rede, olhando para uma foto antiga na parede. Era uma foto de quando eles começaram a namorar, coisa de uma ou duas semanas depois, ele não se lembrava direito. Só sabia onde tinha tirado, numa cachoeira pequenininha, uma água fria que doía de ficar embaixo. Ela insistiu pra tirarem aquela foto ali, fazendo pose de beijo de língua enquanto um amigo clicava. Três cliques pra poder dar aquela imagem que ele agora vê enquanto dá baforadas vagarosas e balança a rede, devagarinho, com o pé.
Não tirava Marília da cabeça. Oito meses já desde que ela, na casa dele, lhe deu aquela facada.
“Ela se apaixonou por aquele filho da puta do Cristiano. E ele comeu ela aqui na minha casa.” O cigarro já pelo meio e as lembranças vão e vêm, aos borbotões. Invadiu a casa dela, deu um murro na cara do Cristiano, depois um soco no estômago e a gravata. Marília chorava e gritava, pedindo perdão, a mão puxando com força para soltar a gravata que ia matando o Cristiano aos poucos. Por fim, ele soltou e partiu pra cima dela, puxando-a pelos cabelos até a porta do apartamento e deixando bastante machucada, com dois pontapés. Saiu correndo pelo prédio, desorientado. Só apareceu em casa três dias depois, um trapo humano, os parentes já rodando hospitais, IML, a zona barra pesada aonde de vez em quando ele ia, ligando pras rádios e tal.
Cristiano sumiu. Marília mudou para o sul, ele não sabe pra qual cidade, ninguém diz nada. Aos poucos, a vida foi voltando ao normal. Mas toda vê que ele deita naquela rede...
O cigarro está no toco. Fernando não vai acender outro. Precisa ir dormir, amanhã cedo tem batente o dia todo, segurança de um shopping center. Talvez ainda sonhe com ela, de vez em quando acontece. Mas os sonhos não o atormentam, os sonhos são fichinha perto dos pesadelos que tem deitado na rede, nos cinco minutos que duram o cigarro antes da cama.
*Título de uma música dos Titãs.

domingo, 14 de agosto de 2011

DISCURSO PARA A TURMA DE JORNALISMO 2011.1


Por uma razão de somenos, não li o discurso que fiz pros alunos na festa de formatura. Tem nada, não. Deixo, então, aqui, de presente para eles e para quem mais quiser...São palavras sinceras, sobretudo.

DISCURSO DE FORMATURA
TURMA 2011.1 – CURSO DE JORNALISMO

MEUS QUERIDOS ALUNOS,
MINHAS QUERIDAS ALUNAS,
FAMILIARES, AMIGOS, AMIGAS, COLEGAS DA UFMA, DEMAIS CONVIDADOS:

Fiquei realmente emocionado por ser escolhido como paraninfo dessa Turma de Jornalismo. Uma distinção, uma honraria para mim, cuja felicidade divido agora com todos, especialmente meus colegas da UFMA, tão responsáveis quanto eu pelo percurso que vocês fizeram. Muito obrigado pelo convite!
Como é de praxe nesses momentos protocolares, sempre deixamos aos alunos exortações sobre a carreira, a profissão, os caminhos tortuosos do Jornalismo, com seus perigos, seus idílios, suas arapucas, etc, etc, etc.
Mas eu não sou muito dado a protocolos, por isso vou fazer diferente. Ao invés de discorrer apenas sobre a profissão, quero falar também da vida. Isso não é sem motivo. Faço assim para já adiantar o conteúdo de um livro de autoajuda no qual estou trabalhando: um arrazoado de 99 lições de vida, minhas e das pessoas com quem venho convivendo e de quem tiro coisas positivas. Ainda estou escolhendo o título, mas muito inclinado a ficar com este: “Faz por ti, que eu te ajudarei.” É uma frase pouco conhecida, mas parece que foi um cara muito importante quem disse. Ainda vou conferir no Google...
Pois bem, dessas 99 pílulas de sabedoria, escolhi sete para lhes deixar nessa noite.
PRIMEIRA: Cultivem os amigos que vocês fizeram na faculdade, aproveitem para se reconciliar com aqueles com quem vocês se indispuseram. Isso tem duas utilidades. A primeira é ontológica, afinal, o “Homem é um ser social”, já dizia um filósofo, parece que um tal de Joedson, um cara pouco lido e menos ainda compreendido no seu próprio tempo...Todos precisamos dos outros, em algum momento da vida, ou quase sempre, ou sempre. Por isso é bom ter amigos. A segunda razão é pragmática: o seu amigo de hoje pode ser o seu chefe de amanhã; o seu desafeto, também... Em muitas oportunidades da vida, vocês vão perceber que o network é mais importante que o diploma que vocês acabaram de receber...
SEGUNDA: Tenham uma relação com um Ser superior, tenham fé em alguém. E aqui não importa se esse alguém se chama Deus, Jeová, Buda, Alá, Brama, Maomé, Dalai Lama, Tupã ou Professor Astro. A sua fé é inquestionável, seus dogmas devem ser respeitados, sejam eles quais forem, desde que lhes façam felizes e não agridam os que os rodeiam. A fé é a estaca na qual nos seguramos quando todo o resto em nossa volta desaba.
TERCEIRA: Aos que ainda não casaram e desejam fazê-lo um dia, façam bons casamentos. O casamento é uma instituição que se sustenta no amor, no sexo, no dinheiro e no companheirismo, tudo isso junto, independente de ordem. Numa alegoria, o casamento é um triângulo de quatro lados. O casamento, independente do modelo, sempre faz bem. Mas o bom casamento faz melhor...
QUARTA: Não se matem de trabalhar para dar conta das quinquilharias materiais que vocês acabaram por obter achando que precisam de tudo aquilo. Guardem um tempo para viver: ir ao cinema; banhar de chuveirão domingo com umas duas na cabeça ou não; namorar; viajar; ficar na internet navegando e não apurando; brincar com as crianças, suas ou emprestadas; ouvir música; ver televisão, inclusive programas ruins; papear, cara a cara; ir à igreja; mergulhar no Tocantins; sonhar no chão da sala.
QUINTA: Leiam sempre. Mas não leiam só por obrigação, por dever do ofício que abraçaram, não. Leiam também por prazer. Façam leituras edificantes {Nota explicativa: leitura edificante, aqui, não tem nada a ver com folheto de condomínio fechado...}. Leiam aquilo que vocês acham prazeroso e importante. Toda leitura serve para alguma coisa, mesmo que não sirva para nada, aparentemente. A leitura instrui, diverte, entretém, é companhia nas horas fáceis e difíceis.
SEXTA: Guardem uma reserva financeira. Não gastem tudo o que ganham, muito menos mais do que ganham. Não acreditem naquele vovô de uma certa propaganda de uma financeira local que declama, entusiasticamente: “Na fulana de tal eu posso...”. Pensem no futuro. A profissão, como tudo o mais nesses tempos liquefeitos, é um tanto quanto instável. Tenham alforjes cheios para, se houver necessidade, sobreviver em tempos de laudas vazias... Lembrem-se da fábula da formiga e da cigarra...a verdadeira, de La Fontaine.
SÉTIMA: Vejam telenovela. Como dizia meu querido professor Aluízio Ramos Trinta, no mestrado da ECO, na UFRJ, “a telenovela é o espelho da vida brasileira.” Ontem estava vendo “Insensato Coração” e me deparei com a cena em que o personagem André, vivido por Lázaro Ramos, é surpreendido pela notícia de que tem câncer...no testículo. Parece uma cena ingênua, mas só parece. Para quem acompanha a novela, o André é bem sucedido, autossuficiente, namorador e...negro! Como toda narrativa encerra uma sanção no seu final, o final de um negro pegador de mulheres lindas, brancas e algumas ainda loiras não podia ser outro que não a purgação da insolência. A novela é o espelho da sociedade, e nossa sociedade ainda é muito preconceituosa... com negros, com homossexuais, com idosos, com pobres, com favelados, com deficientes de toda ordem, com profissionais pouco qualificados, com quem não tem um “comportamento de manada”. A esses, resta uma espiral do silêncio, velada mas firme como um torniquete...
Mas e a Maria Cesária? Aquela negra linda e cozinheira que, na novela das seis, casou com um príncipe branco de olhos verdes? Maria Cesária vai ser rainha de Seráfia e, como toda narrativa de realismo fantástico como é Cordel Encantado, Seráfia não existe na vida real, Seráfia não é o Brasil...
Por que falar de novela num momento como esse? Porque a novela, como uma caixa de Pandora, encerra nossos piores preconceitos. E, para não deixar de falar em jornalismo no final deste discurso, a missão de nós, jornalistas, é lutar para diminuir os preconceitos – para mim, a maior praga do século que se inicia e cujo final não veremos...ou veremos?
É isso. Sejam felizes, da melhor forma que acharem que podem ser. Façam valer a vida, pois, como disse Benjamim Disraeli, escritor britânico, “A vida é muito curta para ser pequena.”
Muito obrigado!!

MEU PAI, MEU AMIGO


Dia dos pais é o momento de rememorar. E eu me lembro do meu pai com duas imagens bem marcantes: a do pai sério e a do pai provedor.
A primeira está associada à figura carrancuda de papai, que pouco sorria e estava sempre presente, onipresente, para nos corrigir, às vezes apenas com aquele olhar gelado que nos fazia tremer...
A segunda é a do homem responsável que não deixava faltar nada em casa: comida, remédios, roupas, material escolar, livros, um passeiozinho de vez em quando, sapatos, os eletrodomésticos que mamãe pedia, os presentes nas datas especiais.
Papai sempre teve, para todos nós, uma imagem de muita austeridade.
Mas aí mamãe morreu, em 2001. E papai sofreu muito, ficou muito só, enfraqueceu e começou a sentir as moléstias da situação e da idade. Papai mudou.
Os filhos, já todos crescidos, perceberem que papai mudou e se achegaram mais a ele.
E, da relação pai e filho, viramos amigos. Amigos e confidentes. Confidentes e conselheiros. Conselheiros e cúmplices.
E aquele pai que tinha uma imagem tão fria agora é um amigo caloroso. Daqueles que a gente abraça, beija e diz “eu amo você” sempre que tem oportunidade.
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De filho, eu virei também pai – é a lei da vida. E eu, desde cedo, procurei fazer o dever de casa, o da conquista e da amizade. Para não correr riscos.
Amo ser filho. Amo ser pai. “Amo muito tudo isso”, como diz na propaganda do Macdonald’s.

GALERIA DE FOTOS COMO FILHO







GALERIA DE FOTOS COMO PAI



quinta-feira, 11 de agosto de 2011

OS AMIGOS


O resto que sobrou do barro de Adão, Deus guardou pra fazer os amigos. Porque os amigos parece mesmo que são parte da gente, de tanto que nos conhecem, de tanto que os sentimos perto de nós.
Feliz de quem tem amigos. Infeliz daquele que não os tem nos momentos em que mais precisa.

terça-feira, 26 de julho de 2011

UM CONTO NOVO


A VIDA É DOCE
- Eu sou apenas uma mulher prática. A última frase foi dita já com as malas dele saindo pela porta e ela mandando o taxista subir para pegá-lo.
Anita nasceu prática. Poucos brinquedos na infância, poucos namorados no colégio para não distrair os estudos, uma faculdade feita trabalhando e paga com enormes dificuldades, mas sempre em dia, um diploma de advogada que lhe daria (pensava então) um sossego na vida adulta. Deixou os beijos, os abraços, as saídas com a turma e o sexo para depois dos vinte e cinco, do escritório montado e do carro na garagem.
Agora, com trinta anos, percebeu que poderia ter sido mais emotiva, se deixado levar por pequenas loucuras de adolescência e de universitária que, enfim, não seriam a pior coisa do mundo – como quando daquela vez que podia, por exemplo, ter experimentado maconha na calourada e não quis por medo de se viciar. Aquele porra louca do Tarciso experimentou, chapou a faculdade inteira e hoje é procurador do trabalho.
Os namorados também podiam ter frequentado mais as letras do alfabeto. Que ela lembre, só dois antes desse desastre que foi o Ciro. Perdeu a virgindade com o Ciro porque achava que ele seria o cara que iria tirá-la de uma vida de dificuldades. Afinal, ele era professor universitário, consultor de uma grande empresa de remédios e outras cositas mas. Depois que deu pra ele e foi ficando pelo apartamento que ele alugou para impressioná-la, percebeu a furada: o cara era um fodido, um desorganizado com as finanças, devia todo mundo e tinha os bens vinculados a uma ex-mulher que ela só descobriu fuçando as coisas dele, quando já não dava mais para recuar... Uma vida de aparências, a do Ciro, na qual ela estava irremediavelmente metida até o pescoço.
Decidiu não ter filhos. As duas vezes que engravidou, botou pra fora, uma inclusive na mesa de cirurgia de uma clínica clandestina. Melhor correr o risco de se estrepar do que levar pela vida toda um pedaço daquele doido lascado, ela disse numa mesa de bar a uma amiga, que se escandalizou mas compreendeu e prometeu guardar segredo. Não guardou e agora ela tinha que dar explicações sobre isso ao Ciro, numa briga em que ele lhe deu um tapa no rosto. Foi aí que ela decidiu botá-lo pra fora de casa, pois podia ter sido tola, mas ainda era uma mulher prática.
- Foda-se a sua praticidade. Você vai acabar seus dias velha, feia, sozinha e toda fodida, porque ninguém vai querer ficar ao seu lado, sua cadela escrota. Ciro gritava do táxi, empurrando as malas pra dentro e contando os abortos para quem quisesse ouvir. Anita estava sentada no piso, embaixo da janela, com as mãos nos ouvidos e os olhos fechados. Quando tudo se acalmou, levantou-se, enxugou uma lágrima que ia caindo – uma só! -, desceu e foi mandar lavar o carro.
No fim daquela semana, ela já estava com as senhas trocadas, um outro netbook, o cabelo pintado de loiro e num apartamento novo, alugado mobiliado de uma amiga que estava indo para um estágio no exterior. Um apartamento num condomínio com porteiro, para não correr o risco de o maluco do Ciro querer invadir.
{Imperatriz, 22.07.11}

segunda-feira, 25 de julho de 2011

MINHA MÃE, SAUDADE ETERNA


Hoje faz 11 anos que minha mãe morreu. Parece que foi ontem. O tempo pode até amainar as saudades, mas nunca as mata, nunca as mata...

sexta-feira, 22 de julho de 2011

CURSO 'REDAÇÃO & SUCESSO PROFISSIONAL

Acabamos de encerrar a segunda turma do Curso "Redação & Sucesso Profissional", aqui em Imperatriz.
O curso aconteceu no Sind. dos Bancários, a semana toda, à tarde.
Agradeço a todos e todas que compartilharam esse momento comigo.
Abaixo, as fotos:








quinta-feira, 21 de julho de 2011

CONTO E CONTRACONTO...


Quem mandou eu estimular meus alunos a escreverem?
Dei um conto meu em aula para trabalhar as formas narrativas.
Qual não foi minha surpresa quando a Liana me enviou, dia desses, uma 'resposta' ao conto, muito criativa e original.
Li, gostei e fiquei contente de meu texto ter provocado outro. Acho que esse deve ser a maior retribuição de quem escreve...

Abaixo, os dois contos de que estou falando, o meu e o dela.
Agradeço as leituras:


RISCO III
(Marcos Fábio)


Ele sustentava três criaturinhas consumistas. As duas crianças, as piores exigências. Era o shopping, era o lanche do shopping, era o cinema, era a tv por cabo, era o videogame, era o lanche da escola, era a pizza do domingo à noite, era o presente para o aniversário do coleguinha do condomínio, era a roupinha nova para o aniversário do coleguinha do condomínio, era a natação, era o particular, era o inglês, era a revistinha, era a pipoca na frente da escola, era o material extra para a aula de artes, era o passeio da escola no fim de semana, era um presente qualquer visto na rua. A mulher lhe exigia um pouco menos, um pouco só.
Um dia, numa dessas viagens do trabalho, ele conheceu a Carolina. A Carolina trabalhava. A Carolina era independente. A Carolina era despojada de coisinhas materiais. A Carolina era viúva e seu único filho estava se formando naquele ano e já morava com a namorada. A Carolina se apaixonou por ele. E ele por tudo o que representava a Carolina.
Ele não pensou duas vezes quando a Carolina, três meses após o início do tórrido romance, fez o convite. Levou as roupas, os livros e os cd´s para o apartamento dela.
E as três criaturinhas consumistas tiveram de se virar sozinhas.



RISCO DE UMA CAROLINA
(Liana Melo Lima)

Fazia um ano desde que ele mudou definitivamente pra casa dela. Pensando naquele dia Carolina até sorriu um pouco, pois lembrou-se da sensação daquele momento, do seu triunfo ,finalmente ele havia abandonado a família pra ser só seu.
Mas o que poderia ter mudado tudo em tão pouco tempo?
Seria a roupa suja jogada no chão ou a toalha molhada sobre a cama? Seria a pasta de dente sempre aberta ? Seria a visita dos filhos dele que faziam de tudo para pirraçá-la? Seriam os desentendimentos na hora de administrar as despesas? Seria o short velho que ele usava pra dormir? Seria o ciúme que antes envaidecia e agora passou a incomodar? Seria o dia a dia? É... Seria.
Então Carolina não pensou duas vezes antes de despachar as malas dele para sua antiga casa e assim ver a sua própria voltar à tranquilidade de antes.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

DIA DO AMIGO


NO DIA DO AMIGO, ALGUMAS REFLEXÕES:

1) Amigo é aquele que não espera de vc nada em troca...ele exige, pois quer ser tão bem tratado quanto trata vc;

2) Amigo de verdade empresta dinheiro a você e te cobra todos os dias...porque quem não cobra ou o din din não é dele, ou tá lavando dinheiro ou quer comer vc...;

3) O amigo sincero nunca vai falar mal de você...desde que não estejam só vcs dois concorrendo a uma vaga de emprego...;

4) O amigo de verdade quer que você vença na vida e brilhe muito...não mais do que ele;

5) Amizade é a melhor coisa da vida...depois do sexo, do churrasquinho e da cervejinha gelada.

sábado, 16 de julho de 2011

ANIVERSÁRIO DE IMPERATRIZ


Hoje é o aniversário de 159 anos de Imperatriz.
Meu conselho é velho, mas aficaz:
"Para o alto e avante!!"

quinta-feira, 14 de julho de 2011

HOJE TEM PARALAMAS EM IMPERATRIZ



O show é uma promoção da Prefeitura Municipal, em comemoração aos 159 anos da Terra do Frei, que será celebrado, oficialmente, no sábado. Presente bom pra nós, que por aqui vivemos!

domingo, 10 de julho de 2011

Um conto da Liana


Liana é minha ex-aluna do curso de Jornalismo. Fiquei alegremente surpreso quando ela me mandou este conto. Li e gostei. Compartilho:

SORRISO



Ela olhou o calendário e confirmou, faz quatro meses que o perdera para sempre, não que essa consulta fosse necessária, pois aquela era uma conta que fazia todos os dias, quase automaticamente.

-“É muito recente”, falou Mel em voz alta, mas para si mesma, tentando justificar sua tristeza.

Desde aquele dia, desde aquela notícia, nunca mais tinha sido a mesma. Talvez não quisesse mais ser, talvez jamais poderia voltar a ser.

Porém Mel nunca havia refletido sobre essas coisas antes, pois na verdade ela não formava ideias, não projetava, não mais fazia planos. Não andava chorando pelos cantos, nem se maldizendo. Mas a verdade é que agora ela só sofria, resolvera guardar sua dor o mais fundo possível, por achar que sofrer calada diminuiria o clima tenso que pairava naquela casa. Na verdade, não se sabe quem mais fingia, se Mel ou a família. Ou talvez não fosse fingimento de nenhuma das partes, apenas uma autodefesa, quase instintiva.

Naquele dia Mel acordou diferente, não podia tirar da cabeça o sonho que teve, quase não podia acreditar, havia abraçado ele de novo, foi o sonho mais real que tivera. Ele veio andando, sorrindo, ambos caminhavam para um abraço, o mais gostoso que já dera em alguém.

Já era noite e ainda não tinha conseguido parar de projetar aquele sonho em sua mente. Sentaram-se à mesa para jantar e Mel não resistiu e num impulso disse:

-Sonhei que o abraçava!

Imediatamente lágrimas desceram dos olhos de todos, menos dos de Mel; do seu rosto brotou um lindo sorriso, o primeiro em meses. Pois só nesse momento, ao ouvir suas próprias palavras (“Sonhei”. “Sonhei que o abraçava”), ela percebeu que voltara a sonhar.

Enquanto Mel revivia aquele sonho durante todo o dia, acrescentou a ele mais momentos mágicos, os que haviam passado e os que ainda viveria. Pensou em cada uma das vitórias que ainda alcançaria e que ele não iria presenciar. Mas curiosamente isso não a entristeceu, pelo contrário, sentiu-se totalmente motivada, agora ela sabia que a cada conquista, que em cada dia alegre, ou difícil, mesmo ela não vendo ele estaria lá para abraçá-la, e sempre rindo...

Não sei se os outros entenderam, o que sei é que desde aquele dia a dor ainda apertava, ainda havia dias nos quais não dava para conter as lágrimas, porém Mel agora vivia e sonhava. Sabia que ele não iria voltar, mas também sabia que onde ele estava ele só sorria, só sorria...


Liana Melo Lima Bittencourt
25-junho-2011

quinta-feira, 7 de julho de 2011

DE VOLTA.


Passei quase três semanas sem net e sem celular.
Tava no Amazonas.
Depois escrevo sobre esse périplo.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

A PARTE 2 DO CONTO DE BAIXO...


A MOÇA DO PIANO

Não sei se disse, mas sou representante de um produto japonês de massagem. Viajo o país inteiro apresentando ele em todo tipo de local: feiras, farmácias, reuniões beneficentes, vou até de casa em casa, quando a cidade é muito pequena. É um massageador que as pessoas usam nas costas, nos pés, nos braços, onde tiver uma dorzinha ele chega e resolve. É isso que o panfleto diz. O panfleto traz a foto do japonês que inventou o aparelho, um baixinho atarracado e com metade da cabeça já careca, vestido de quimono. Quem compra o aparelho ganha dois potes de gel. O gel é que evita que a ponta do aparelho, que é uma bolinha que fica tremendo na pele, machuque as pessoas. Mas já me disseram que o sucesso do aparelhinho do japonês é mesmo porque ele é usado como vibrador. Não quero nem saber, é ele que me faz viajar, conhecer muitos lugares e me fez comprar minha casa, meu carro e criar meus filhos até agora.

Adoro viajar. Fico às vezes duas, três semanas fora de casa. Gosto do cheiro de amaciante das camas de hotel, com lençóis limpinhos, dos cafés da manhã, sempre cheios de coisas, dos sorrisos das recepcionistas e da curiosidade delas pra saber o que é que existe naquela mala enorme que eu carrego pra cima e pra baixo. Vou quase sempre de avião, porque a firma do japonês arca com todas as despesas. Esse produto é bom mesmo, porque o japonês tem um monte de representantes como eu, espalhados nos cinco continentes, vendendo, vendendo o aparelhinho massageador-vibrador em todas as línguas que se possa imaginar. Uma vez por ano, o japonês faz uma conferência de vendas, um encontro pra todos nós dizermos quanto vendemos. São números impressionantes. Mas mais impressionantes são os lugares em que esses encontros acontecem: Malibu, Caribe, Costa do Sauípe, Himalaia, Honduras, Jamaica, já houve até um em Havana, apesar de o japonês ser um capitalista que odeia ouvir falar em socialismo. Mas no caso de Havana, o motivo foram as boates...maravilhosas! Aliás, esses encontros são mesmo só pra farra, os tais números são apenas pra mascarar as farras que o japonês gosta de proporcionar pra nós, que aumentamos a sua fortuna pessoal em dezenas de milhões de dólares a cada 365 dias.

Viajo por todos os estados do Brasil. Acho que já refiz o mapa territorial umas vinte vezes, sem exagero. Posso estar, num mês, no meio da floresta amazônica, daí a quinze dias no frio de Curitiba e daí a mais uns dez dias numa cidadezinha litorânea do Ceará. No Brasil, somos apenas três representantes e não existe essa de área demarcada de cada um, não. Eu posso me deslocar pra onde eu bem entender, em qualquer direção, sem dar satisfação a ninguém, nem mesmo ao japonês. O japonês, aliás, nunca quer saber por onde andam seus representantes. Só quer saber do seu caixa tilintando. Ao final de cada mês, enviamos o nosso mapa de despesas pra um escritório que ele tem em Tóquio e eles nos ressarcem as despesas dez dias depois, no máximo.

Uma noite estava em Floripa e ouvi uma música no piano-bar do hotel. Eu cheguei de uma visita a uma academia de ginástica, na verdade um enorme centro de estética que faz de tudo. Eles estavam interessados em vender o aparelhinho e queriam saber se podíamos fazer uma parceria e tal. Eu expliquei que não fazemos parcerias, não damos descontos, não vendemos a prestação. O que podemos fazer, no máximo, é pegar um cheque para 40 dias. É o máximo que o japonês nos permite facilitar. E também não vendemos em grandes quantidades, no máximo duas caixas por compra, o que dá 48 maquininhas. O japonês é meio esquisito no quesito adaptação a novas estratégias de marketing e vendas. É isso e o panfletinho de que já falei, e só. Mas talvez seja esse mesmo o segredo do seu sucesso. Orientais...

Foi um dia cansativo, aquele da academia. Convenci, enfim, os donos da academia a ficar com as duas caixas, recebi um cheque para vinte dias e voltei pro hotel. Pus a malona sobre a cama e desci pra beber um chope, que minha garganta já pedia uns. Pois estou entrando no bar, que estava com uma luzinha meio morta e um punhadinho de gente: um casal num canto no maior love, um grupo de quatro jovens bem loiros, três rapazes e uma menina, e eu. No fundo do bar, sob um pequeno holofote, uma moça ao piano. Tocava de cabeça meio baixa e o cabelo grande e caído não deixava ver muito bem o seu rosto. Ouvi aquela melodia, olhei para a moça no canto e não tive nenhuma dúvida: era ela.

Tantos anos já. Pelo visto, ela deve ter deixado de tocar na igreja. Senão não estaria ali, pensei. E já não era a jovenzinha que carregava o caderninho e estava sempre de vestido. Naquela noite, pelo contrário, ela estava vestida num tailleur preto, uma calça meio justa, dava para ver as pernas grossas encherem o tecido nos lados da coxa. Quantos anos deveria ter? Só que eu não visitava a cidade onde nos conhecemos já se iam 15 anos. Naquela época, ela devia ter uns dezessete anos, presumo, então agora ia pelos 32, 33, mais ou menos. Mas ainda era encantadora. E, para meu desespero, estava tocando cada vez melhor, com mais suavidade do que nunca.
Sou um apaixonado por música, mas um músico frustrado. Nunca consegui aprender a tocar nenhum instrumento, apesar de já ter frequentado aulas de tudo o que é tipo de coisa: violão, piano, baixo, guitarra, os de sopro quase todos. Também fui coralista na igreja onde fiz a primeira comunhão e a crisma. Talvez essa frustração por tocar um instrumento tenha me levado a ser quase um alucinado por música. Tenho uma cdteca de fazer inveja a muitas rádios consideradas boas. Só de piano tenho uns 150 álbuns.

Ela tocava divinamente. Os dedos deslizavam sobre as teclas pretas e brancas do piano. O ritmo perfeito. Até a postura dela era perfeita: a coluna ereta lhe dava um ar altivo, uma delicada sinuosidade. Criei coragem e sentei mais perto, levando meu chope. Fiquei bem pertinho dela, escutando aquela música, abobalhado. Dava pra sentir o perfume dela de tão perto que eu estava. Dava para ver seu peito subindo e descendo da respiração. Dava pra ver que ela estava notando aquele cara bem perto, olhando pra ela com cara de tarado ou de abestalhado, não sei o que ela pensou.

Quando a música parou, não me contive a bati palmas. Os caras loiros da mesa me acompanharam, o casal não. Quis perguntar o nome dela, mas uma vergonha absurda tomou conta de mim. A única coisa que me permiti dizer foi que eu tinha adorado, adorado. Ela deu um sorriso complacente, pegou a pasta de folhas de saco plástico e se foi.

Nunca consegui me perdoar por não ter, naquela hora, chamado ela pra mesa, dito que eu a conhecia dos tempos da igreja, perguntado o seu nome, dito que eu adorava a música que ela tocava desde que ela tinha uns dezesseis, dezessete anos e me encantava lá na igreja. Que eu ia todos os domingos, todos os domingos, religiosamente, por causa dela. Ficava ouvindo os cantos daquelas bandas chatérrimas por causa dela. Aguentava, por causa dela, ouvir o pastor dizer que eu vivia em pecado e que minha alma ia arder eternamente no inferno. E que ela me devia ao menos o nome, por todos esses anos que eu passei ouvindo a música dela ressoar na minha cabeça, de quando em vez, nos horários mais absurdos. Ela me devia ao menos o nome...

UM CONTO...


O PIANO

Todos os domingos eu ia religiosamente à igreja. Mas não ia pra orar nem pra louvar ao Senhor nem nada dessas coisas de palavra de Deus, não. Eu ia era pra ver ela tocar piano. Ela era uma visão do céu, parecida com aquelas imagens de anjo que eu via no meu livro de catecismo, quando era guri. E a música que ela tirava do piano era maravilhosa.

Eu chegava cedo na igreja e me sentava bem na frente de onde o piano ficava, esperando a hora dela chegar. Ela entrava, normalmente, uma meia hora antes, para passar as músicas. Trazia um caderninho, que um dia eu vi cheio de uns sinais estranhos, deviam ser as notas musicais que ela tocava. Sentava no banquinho, abria o piano, botava o caderninho numa espécie de prateleirinha, onde ele ficava penduradinho e dando exatamente para ela ver os sinais e tocar por eles. Tocava sem acompanhamento. Era uma igreja tradicional, muito silenciosa. Nada daqueles cultos cheios de guitarra, bateria, baixo que mais parecem um show de rock, com um pessoal tocando e cantando histericamente. O pastor tocava violino, de vez em quando, fazendo dueto com ela no piano – uma maravilha!

Verde, vermelho, amarelo, azul, lilás...Ela variava muito a cor do vestido. Mas sempre usava vestido, nunca calça nem saia nem outro tipo de roupa. Sempre vestido. Não devia ser norma da igreja, não, porque via muitas meninas lá de blusinha, jeans justinho, até de decote. Talvez fosse pelo fato dela tocar o piano, e o piano impor uma certa postura mais clássica, sei lá. Só sei que eu adorava quando aqueles vestidos entravam na nave da igreja, sentavam e dedilhavam uma música celestial, invadindo meus ouvidos e tomando conta do meu cérebro inteiro.

Na primeira vez, entrei na igreja por acaso. Tava em casa sem nada pra fazer, aí fui dar um passeio. Quando passava na frente do prédio, ouvi a música. Fiquei curioso, era uma música tão suave, tão diferente...Entrei e dei com ela passando os hinos, quase ninguém ainda tinha chegado. Sentei na frente dela e fiquei de olhar fixo nos dedos que deslizavam pelo piano. Nem piscava. Acho que ela percebeu, pois me olhou depois de ter passado as músicas e fez um cumprimento muito sutil, acenando com a cabeça e dando um risinho mínimo, mas eu percebi.

Fui muitas vezes à igreja, sempre na esperança de que ela nunca faltasse. E ela nunca faltou enquanto eu morei na cidade, vários anos. Mas um dia eu voltei lá pra rever uns parentes, fui ao culto e não encontrei mais ela. Não quis perguntar nada, porque não conhecia ninguém na igreja, frequentei todos aqueles anos como um desconhecido e ninguém se importou de saber nem o meu nome. Melhor assim. O piano ainda estava lá, mas só de decoração, nenhum som. Agora tem um cara tocando violão, ainda bem que não é uma daquelas bandas que ficam se esgoelando pra ver se Jesus ouve lá do céu. O pastor também mudou, agora é um mais novinho. Assisti só a metade do culto e fui embora antes de tirarem a oferta.

Americana



Este é um vídeo de muita sensibilidade: poesia, música, colagens culturais, cinema...é tudo junto. Zeca Baleiro, Fernando Abreu, Celso Jorges e Vítor Ramil. E o liquidificador, claro, ligado em 380 V.

UM TEXTO DA ANA PAULA


Tava devendo este texto da Ana Paula, que tentei publicar no blog antigo (do uol), mas a matrix não deixou. Ei-lo:

Príncipes não existem

Eu vivia displicentemente. Não tinha responsabilidades emotivas. Não sabia bem o que era amor, desejo, paixão. Não fazia ideia do que era amar ou ser amada. Contentava-me, apenas, com minhas aventuras mal resolvidas.

Mas o destino adora aprontar boas peças aos corações. A esses corações negligentes. É prazeroso pra ele ver as batidas aceleradas, as gotas de suor derramadas, as unhas ruídas, a respiração ofegante. O destino alegra-se com todas as sensações idiotas que sentimos quando nos julgamos apaixonados.

E foi através desses sintomas que descobri o que sentem os amantes. Tudo era perfeito! Um sonho! Um verdadeiro conto de fadas! Sim! Com príncipe encantado e tudo mais. Cada vez que os braços dele se estendiam a mim, era como se abrissem as portas de um magnífico reino encantado.

Passei a dedicar minha vida, então cor de rosa, a essa fantasia. Eu dissipava formosura aos quatros cantos. O Telefone passou a ser meu melhor amigo. O barulho de seu toque tornou-se melodia aos meus ouvidos. E do outro lado da linha a mais suave das notas musicais. O dia já não apresentava, por mim, nenhuma simpatia.

Propositalmente passava lentamente para que eu não pudesse encontrar-me com minha grande aliada: a noite. Era nela que a voz tomaria cheiro, forma, cor.

Mas diferentemente dos contos de fadas, na vida real não existe “felizes para sempre”. O que existem são apenas as bruxas, os dragões e as maçãs envenenadas. Ao contrário das fantasias, no real, os príncipes é que viram sapos.

Hoje meus dias passaram de rosados a cinzentos e já não tenho nenhum vínculo afetivo com o telefone. O dia deixou de ser um obstáculo. E a noite já não mantém comigo a mesma cumplicidade. E o sonho? Bem. o sonho, eu não diria que virou um pesadelo, diria apenas que se transformou em uma dura realidade. Apesar de tudo, foi bom tê-lo sonhado. Pois aprendi que quando um livro se fecha, a história se acaba. Mas há sempre outro pronto a ser explorado. Com novas aventuras. Às vezes até mais emocionantes e que também vão te fazer rir, chorar, gritar, suar, pulsar, ofegar.

Mas que, acima de tudo, vão simplesmente fazer SENTIR!

quinta-feira, 16 de junho de 2011

CRONIQUETA...


QUANDO O ASFALTO CHEGAR AO SANTA INÊS

Marcos Fábio Belo Matos – jornalista e professor do Curso de Jornalismo da UFMA/Imperatriz – marcosfmatos@gmail.com

O Santa Inês é um bairro bem pitoresco de Imperatriz. É um bairro de periferia, localizado no que antes se chamava Quinta do Jacó, uma fazenda que foi tendo seus arredores ocupados pouco a pouco por uma população de trabalhadores de origem simples e hoje, de uns cinco anos pra cá, virou uma floresta de condomínios fechados, de muros altos, cheios de carros e de emergentes, de portões automáticos e cercas elétricas. Só eu já contei uns oito feitos e alguns outros por fazer, para tudo o que é desejo e bolso das várias classes médias.

Nas poucas ruas, é possível ver as pessoas sentadas na frente das casas. A gente passa de carro e as elas estão lá conversando, as crianças brincando nas portas, cadeiras, rádios de pilha, bicicletas e motos, fardas escolares, cadernos nos braços e mochilas chegando da escola ou saindo para a aula.

Os moradores esperavam, desde que o novo prefeito assumiu, que ele asfaltasse as ruas do bairro. Ele disse que asfaltaria as principais, parece que tinha uma emenda de um deputado com alguns milhões para isso. Quando o povo cobrava, a prefeitura dizia que não podia, porque as chuvas e tals. Agora que as chuvas pararam, parece que a coisa vai mesmo.

Um dia desses, fui passar pela rua lateral do cemitério e não pude. Havia uns montes de areia, umas caçambas atalhando o caminho, uns caras com pás nas mãos ou espalhando terra. Entendi que era a promessa da prefeitura se cumprindo. Fiz um caminho mais longo, satisfeito por ver que agora a coisa ia mesmo.

As principais ruas, como disse a prefeitura, foram raspadas, parece que passaram uma espécie de piçarra, tá tudo durinho, não levanta muita poeira quando a gente passa. As pessoas, que, em algumas ruas mais prejudicadas, não podiam sentar nas portas, agora estão de cadeira na calçada. À tardinha, ficam todos lá. Parecem bem contentes com o serviço. Parecem felizes com o que já foi feito.

Mas fico imaginando mesmo é quando o asfalto chegar ao Santa Inês. Como ficarão alegres as crianças nas ruas, a profusão de bicicletas e patinetes, alguns patins, os moleques riscando de giz aquele enorme quadro negro, novinho em folha. As pessoas vão querer botar as cadeiras é no asfalto mesmo. Os condôminos da floresta casas muradas vão comentar que o valor delas vai subir, se quiserem podem até vender... Aí a gente vai passar de carro (é preciso quebra-molas, autoridades!) e vai ver os velhos, os homens, as mulheres, os moços, as moças e a meninada de riso frouxo, aqueles que não acreditavam que o asfalto chegasse um dia com a cara dos incrédulos satisfeitos por terem sido contrariados. E os que pressagiaram o ‘pretinho básico’, contentes e com aquela frase-clichê: “Eu não disse?”.

Quando o asfalto chegar ao Santa Inês, tudo vai ficar mais bonito, mais moderno, mais valorizado, todos vão se achar mais cidadãos, enfim.

DE CASA NOVA...



É isso aí! Passei uns oito anos no uol, com meu blog (www.marcosfmatos.blog.uol.com.br). Aprendi muito, me adaptei ao formato, escrevinhei muita coisa, alguns me leram por lá.


Agora é hora de arribar e de cantar em outra freguesia. Tou por aqui. A casa é nova, mas eu sou o mesmo (para quem acreditar...).


E vamos indo.



@s amig@s, sempre bem vindos!