domingo, 11 de setembro de 2011

NOVO CONTO


ESCRÚPULOS DE SANGUE
Ele, na verdade, queria a irmã dela. Mas a irmã não caiu na rede dele, a mais velha foi mais fácil. Duas saídas e já a tinha levado pra cama, num hotelzinho vagabundo do centro da cidade. E aí começaram os amarramentos.
Aos trinta anos já, a irmã queria um namoro sério e ele foi ficando nessa condição. Começou a frequentar a casa, às noites, depois passou a ir de dia mesmo, os pais dela não se importavam, eram uns ‘coroas legais’, como ele dizia pros colegas. “Acredita que os coroas já deixaram eu comer ela lá no quarto dela?”. Os amigos duvidavam.
Mas a irmã não saía dos seus planos. Queria-lhe muito. Fazia todos os estratagemas para encontrá-la pela casa, ficava esperando chegar da faculdade, a despeito de ver o final de um filme, só para dar boa noite e vê-la entrar naquele jeans apertado que deixava à mostra todas as formas com que ele sonhava de noite e, invariavelmente, acordava molhado.
Dois anos de namoro, a irmã engravidou e tiveram que consumar o casamento, antes que a barriga aparecesse. Casaram no religioso, cerimônia simples, mas todos os parentes próximos lá.
Mudaram pro Mato Grosso, ela passou num concurso para um desses milhares de tribunais. Ele foi acompanhando, como professor de Matemática não teria problemas de se colocar.
O filho chegou e com ele a irmã, que viera passar um tempo ajudando, pois estava sem fazer nada depois da formatura. E talvez conseguisse uma colocação como assistente social, “o mato grosso é uma fronteira a desbravar”, todos diziam na família.
Um dia a irmã teve que viajar para uma diligência de rotina, coisa do serviço. Só uma semana, ela prometeu ao marido.
No terceiro dia, Ronaldo invadiu o banheiro em que Sandra tomava banho. Invadiu, a bem dizer, é um exagero, pois ela deixou a porta aberta. Amaram-se na lajota fria, no estreito corredor em frente ao do vaso e à pia, a porta escancarada e a criança chorando, com certeza de fome. Dali até a irmã chegar, amaram-se todas as noites, na cama dela, pois a dele não podia desonrar. Era um homem com escrúpulos de sangue, não podia destratar a dignidade da mulher.
Quando Cíntia chegou, encontrou uma casa em perfeita harmonia. Dali a dias, Sandra anunciou que não ia mais embora, que ia tentar mesmo a vida no Mato Grosso, a fronteira a desbravar, e que ela podia viajar tranquila sempre que precisasse.

ITZ, 11.09.11

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